Os discursos na formatura dos oficiais já dava o tom do Batalhão Brasileiro de Força de Paz (BRABAT) 26: o clima é de despedida e de necessidade de perpetuar o legado de 13 anos do Brasil no Haiti. A missão, que nasceu depois de um levante armado contra o então presidente Jean-Bertrand Aristide em 2004, foi a mais ousada aspiração brasileira e os militares enviados têm à frente uma das mais complicadas cargas de trabalho desde seu início.
Treinamento
A seleção dos militares que participam do BRABAT 26 começou ainda no ano passado. De junho a dezembro de 2016, quem se inscreveu para a missão passou por uma peneira de avaliações físicas, médicas e psicológicas. Critérios como a experiência profissional do militar, a capacidade de demonstrar companheirismo e lealdade, além de habilidades técnicas foram levados em consideração.
Os aprovados iniciaram o treinamento no dia 9 de janeiro, que se estendeu até 28 de abril. Além dos procedimentos padrões seguidos pelo Exército desde a primeira leva em 2004, os soldados também foram orientados a reagir em adversidades climáticas, já que o segundo semestre é o mais propício para a
chegada de furacões na ilha.
Outro ponto se concentra no aspecto social do Haiti. Em entrevista exclusiva à Sputnik Brasil, o comandante do BRABAT 26, Coronel Alexandre Oliveira Cantanhede Lago comentou sobre a importância em se conhecer as particularidades do país.
Para ter sucesso, você tem que conquistar o apoio desta população e se você não sabe interagir com ela, não conhece seus costumes, a religião, se não respeita isso, não vai ter sucesso. O soldado tem instruções sobre o país, aprende o básico do idioma crioulo, coisas simples que ajudam na interação. Só de crioulo são 60 horas de treinamento obrigatórias", conta Cantanhede.
Contingente
Ao todo, 970 militares vão compor o efetivo do BRABAT 26 no Haiti. Desse total, 120 são da Companhia Brasileira de Engenharia de Força de Paz (BRAENGCOY) e desempenham funções de natureza técnica.
Os outros 850 são formados por 175 militares do Agrupamento Operativo de Fuzileiros Navais, 6 oficiais da Marinha e 4 da Força Aérea que compõem o Estado-Maior do BRABAT, 30 do Pelotão da Força Aérea e os 635 restantes de oficiais do Exército.
A maior parte do efetivo responsável pelo patrulhamento e pelas operações na rua vieram do Comando Militar do Sudeste, com sede no estado de São Paulo. Foi de lá, especificamente no Aeroporto Internacional de Viracopos que saíram os primeiros 243 na terça-feira. O restante deixa o Brasil nos dias 22/05, 26/05 e 01/06.
Transição e Desmobilização
A Minustah será substituída no Haiti pela chamada Missão de Suporte por Justiça das Nações Unidas, que terá sete unidades com 980 policiais, somados a outros 295 agentes de segurança individuais. Esta nova missão terá efetivo majoritário canadense e permanecerá no país por cerca de dois anos até que o Haiti conclua a transição da segurança para a própria Polícia Nacional do Haiti (PNH).
Segundo o Coronel Cantanhede, ainda não estão previstas reuniões com a PNH para preparar a transição.Isso aí [as reuniões] está sendo conversado, porque até mesmo o efetivo da Polícia das Nações Unidas que vai permanecer a partir do dia 16 de outubro vai ser limitado […]. Aos poucos, eles [a PNH] vão tomando conta, sendo mais responsáveis pelas áreas mais perigosas e contribuindo pela segurança pública local", adianta o coronel.
Já quanto ao trabalho de desmobilização, as tarefas dos soldados do BRABAT 26 serão minuciosas. Será preciso seguir vários memorandos da ONU e acordos bilaterais entre o Brasil e o Haiti sobre o que fica e o que volta para o nosso país. Os militares deverão literalmente desmontar toda a estrutura brasileira em terras haitianas para facilitar a repatriação.
A tarefa será cumprida seguindo orientações do Estado-Maior, paralela ao patrulhamento das ruas. Porém, todas as atividades militares, por determinação da ONU, devem ser interrompidas no dia 1º de setembro.
Para onde vamos agora?
É certo que, após o Haiti, o Brasil vai se empenhar em uma nova missão de paz das Nações Unidas. O
destino, porém, permanece incerto. Em abril, observadores da ONU estiveram nas instalações militares brasileiras para produzir um relatório técnico ao Conselho de Segurança da ONU.
Fontes do Exército dão como certeza o Mali, que vive uma violenta guerra pela soberania territorial desde 2013, enquanto Itamaraty fala no Líbano, local de ascendência do presidente Michel Temer e onde já há destacamento naval brasileiro a serviço da ONU.
Sobre o assunto, a Sputnik falou com exclusividade com o ministro da Defesa, Raul Jungmann durante sua passagem no Rio de Janeiro. De acordo com o ministro, há cerca de 15 opções na mesa de Temer quanto a possíveis destinos das tropas brasileiras, que incluem também o Congo e o Chipre.
A definição tem que ser apresentada pelo nosso presidente da República e levada ao Congresso Nacional. O Brasil pretende continuar como provedor de paz, inclusive pelo reconhecimento internacional que tivemos, a exemplo do que é feito hoje no Líbano. Nós coordenamos a única missão marítima de paz da ONU por lá, há a possibilidade de enviar também forças terrestres, mas não há decisão", disse Jungmann, acrescentando que a opção vai combinar uma série de fatores políticos, econômicos e técnicos.