Durante reunião na Câmara Árabe-Brasileira, em São Paulo, o presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Paulo Rabello de Castro, fez um discurso incisivo contra as taxas de juros no Brasil e diversos economistas que defendem a redução do papel do banco de fomento na indução do desenvolvimento do país.
"A única coisa que não cai é o juro real. A TJLP — Taxa de Juros de Longo Prazo, que norteia os financiamentos do banco — se esqueceu de cair, continua nos 7%." Após classificar os juros elevados de "pornografia econômica", Rabello de Castro voltou a disparar: "Queremos mais moralidade no Brasil? Comecemos pelos juros. Às vezes, a imoralidade veste terno e gravata. País de juro alto não tem direito a futuro."
Ouvida pela Sputnik Brasil, Juliana Inhasz, professora de Economia da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (FECAP), admite que os juros reais no Brasil estão de fato elevados, mas não a ponto de serem classificados de "pornográficos". Segundo ela, as taxas elevadas são ainda reflexo do momento de recuperação econômica, ainda incipiente, e de fatores como elevado desemprego, alto endividamento das famílias e incertezas quanto ao quadro político e econômico.
"Temos uma taxa elevada, mas nossa condição macroeconômica ajuda bastante a explicar porque isso acontece. A gente passa por um processo de reorganização das contas (públicas)", explica a professora da FECAP, observando que o grande déficit do governo obriga a União a emitir papeis para se financiar, puxando com isso as taxas de juros. Hoje a Selic (taxa básica de juros da economia) está em 8,25%, após iniciar o ano em 13%, e projeções do mercado financeiro indicam que fechará o ano por volta de 7%.
Ranking elaborado pela MoneYou e pela Infinit Asset Management aponta o Brasil no terceiro lugar dos juros reais mais elevados do mundo, com taxa de 3,71%, atrás de Turquia (3,93%) e Rússia (4,59%). Segundo Juliana, a redução dos juros já se desenhava desde o ano passado, assim como a de inflação, que também cedeu bastante — o índice de setembro, medido pelo IPCA de 0,19%, o menor desde 1989.
A gente teve queda de taxas de inflação combinadas com essa redução da taxa de juros nominal. Realmente nosso juro real hoje é elevado. E por que isso acontece? Porque o Brasil ainda hoje é um país muito arriscado, uma economia que tem déficit, que precisa se financiar com dívida pública, crescente ao longo dos últimos anos numa velocidade bem alta. Esse financiamento acaba fazendo com que a gente tenha que pagar mais", analisa Juliana.
Estudo divulgado nesta sexta-feira pelo Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil) e pela Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL) revela que 50% dos tomadores de empréstimos hoje no Brasil têm parcelas em atraso. Com os bancos cautelosos na concessão de crédito, muitas vezes os tomadores de financiamentos acabam recorrendo a financeiras, que chegam a cobrar 24% ao mês. Para Juliana, a dificuldade de crédito nos bancos é fruto de dois fatores: medo da inadimplência e concentração de mercado.
"A saída seria a gente tentar colocar nossas contas em ordem. A massa salarial foi caindo muito, as pessoas ficaram mais endividadas e, num momento de crise, esse endividamento leva a um aumento da inadimplência. Bancos e financeiras cobram valores realmente elevados, porque temos um sistema financeiro muito concentrado, o consumidor não consegue escapar de quatro grandes brancos, que acabam dominando por parte desse sistema", finaliza Juliana, acrescentando que boa parte da baixa oferta de crédito se deve também à reduzida demanda por títulos bancários, que acabam por alimentar e permitir a concessão de financiamentos.
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