Agência FAPESP – Dez empresas foram selecionadas na segunda chamada de propostas para o desenvolvimento de produtos e serviços para Sirius, a nova fonte brasileira deluz síncrotron, em construção no Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), em Campinas.
Essas empresas contarão com o apoio do Programa PIPE/PAPPE Subvenção, que soma recursos da FAPESP e da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), para, num prazo de até dois anos, responder a desafios tecnológicos demandados para a construção e operação de um equipamento de pesquisa de 4ª geração, competitivo com síncrotrons em construção ou recentemente concluídos em todo o mundo.
Para as empresas selecionadas – todas com até 250 empregados e, no mínimo, dois anos no mercado –, esses desafios não são triviais. Sirius será formado por um conjunto de aceleradores de elétrons e por estações experimentais, conhecidas como linhas de luz, instalados num prédio de 68 mil metros quadrados. A própria obra, por exigência de estabilidade térmica e mecânica, já constituiu um desafio para a engenharia brasileira.
O acelerador de elétrons principal, com energia de 3 GeV (giga elétrons-volt) terá 518,4 metros de diâmetro e poderá comportar até 40 estações de trabalho, nas quais pesquisadores utilizarão luz síncrotron para “enxergar” a estrutura de materiais em nível atômico. Os resultados destas investigações abrirão novos horizontes para a pesquisa e desenvolvimento em áreas estratégicas como biotecnologia, nanotecnologia, energia, meio ambiente, entre outras.
As empresas selecionadas na chamada PIPE/PAPPE buscam se qualificar como fornecedoras de soluções tecnológicas para Sirius, como, por exemplo, veículos não tripulados para o monitoramento do túnel de concreto que abriga o acelerador, câmaras de ultra-alto vácuo e processos de manufatura aditiva.
“A expectativa é que, ao final de dois anos, todas essas empresas entreguem protótipos que serão testados pela equipe de engenheiros e cientistas responsáveis pelo projeto Sirius”, afirma José Roque da Silva, diretor do LNLS.
Mercado nacional de fornecedores
Outras oito empresas, selecionadas em 2015 na primeira chamada de propostas do PIPE/PAPPE Subvenção, já estão desenvolvendo 13 projetos para Sirius, como bloqueadores de fótons, detectores de raios X e componentes de cerâmicas covalentes.
“A ideia é criar um mercado de fornecedores nacionais e, ao mesmo tempo, qualificar essas empresas para que utilizem o conhecimento adquirido em outras aplicações no Brasil e no exterior”, sublinha Roque da Silva.
A FCA Brasil, em Campinas, fabricante de peças e equipamentos metálicos especiais, por exemplo, está fazendo o condicionamento de câmaras especiais de ultra-alto vácuo confeccionadas em aço inox, projeto selecionado na primeira chamada de Sirius. A empresa também foi aprovada na segunda chamada e vai confeccionar câmaras de ultra-alto vácuo em alumínio.
As câmaras de ultra-alto vácuo delimitam o ambiente no qual trafega o feixe de elétrons, mantendo-o a uma pressão inferior a 1ntorr (<10-7 a="" atmosf="" com="" confeccionadas="" de="" dimens="" e="" es="" especiais.="" exige="" materiais="" menor="" o="" pa="" press="" que="" rica="" sejam="" span="" trilh="" um="" vezes="">10-7>
A FCA já domina a tecnologia de produção de câmaras de ultra alto vácuo convencionais, em inox. O desafio agora é produzi-las em alumínio. “As vantagens do alumínio são o baixo peso e a permeabilidade, melhorando a qualidade do vácuo”, afirma Artur Domingues Tavares da Silva, responsável pelo projeto aprovado na segunda chamada de Sirius. O problema, ele sublinha, são os processos de solda. “Não pode haver porosidade e é preciso compatibilizar o alumínio com outros materiais, como inox ou cobre utilizados nas flanges.”
Criada em 2005 e atualmente com oito funcionários, a FCA já fornece câmaras convencionais para o UVX – o síncrotron de 2ª geração, atualmente em operação no LNLS. A expertise adquirida abriu novos mercados para a empresa no Brasil. “Temos como clientes o Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen) e alguns laboratórios federais de pesquisa”, afirma Daniela Munerato Arroyo, sócia da empresa.
A FCA foi recentemente reconhecida pela Sociedade Brasileira de Vácuo “como a única empresa no país conhecida e reconhecida como capaz de fabricar componentes e equipamentos de vácuo a operar na faixa do Ultra-Alto Vácuo-UHV ou inferior a esta”. E começa a negociar projetos no mercado externo. “Estamos em contato com o síncrotron do Canadá [Canadian Light Source (CLS)] e em entendimentos com o GMT [Giant Magellan Telescope] , no Chile”, ela diz.
”Competição saudável”
A FCA não foi a única selecionada para o desafio de construir câmaras de ultra-alto vácuo. “A competição entre empresas é saudável”, explica Roque da Silva. A Promac Equipamentos, em Sumaré, também vai desenvolver protótipos desse equipamento. “Temos 150 funcionários, 30 anos de mercado e faturamento anual de R$ 18 milhões”, descreve Diego Roberto Dias da Cruz, engenheiro responsável pelo projeto. Especializada em transporte e movimentação de material, e fornecedora da Gerdau, da Votorantim e da AcelorMittal, a empresa “busca novos desafios”. “Isso exigirá muita pesquisa e equipe qualificada”, sublinha Cruz.
Outras tecnologias, como a de desenvolvimento de comboio não tripulado para o monitoramento do túnel que abriga o anel, por exemplo, despertaram grande interesse dos concorrentes, mas apenas uma empresa foi selecionada. “Vamos projetar um veículo movido a bateria, que se move sobre trilhos, carregando computador, câmera, sistema de comunicação, sistema anticolisão, entre outros. O grande desafio está em fazer o reconhecimento por imagem”, resume Nilton Dias Borrego, diretor técnico da Wisersoft Tecnologia em Sistemas
Criada em 2008 para desenvolver sistemas de automação e com clientes na área espacial e aeronáutica, a Wisersoft enxerga na resposta ao desafio de Sirius a oportunidade de conquistar novos mercados. “A mesma tecnologia pode ser utilizada na vistoria de túneis do metrô, em galeria de mineração ou mesmo em portos. Como o veículo é operado por controle remoto, também é aplicável em áreas industriais de grande extensão”, diz Borrego.
A equipe de engenheiros e cientistas do LNLS fará regularmente o acompanhamento dos projetos. “Algumas empresas selecionadas na primeira chamada já estão bem avançadas em seus projetos de detectores, de cerâmicas e em alguns da área de eletrônica”, adianta o diretor do LNLS. A FCA, ele exemplifica, já está pronta para competir no mercado externo. “O projeto Sirius e a FAPESP transformaram uma empresa familiar numa empresa de tecnologia de classe mundial”.
Roque da Silva acredita que as empresas responsáveis pelo desenvolvimento de cabanas experimentais – área protegida de radiação onde são realizados os experimentos com luz síncrotron – também podem ter boas oportunidades no mercado externo, do ponto de vista da tecnologia. “O próprio LNLS acaba lhes abrindo as portas internacionais, já que nossos eventos e seminários reúnem especialistas de síncrotrons do mundo todo.” Mas ressalva: “Essas empresas precisarão de apoio para conquistar mercados no exterior já que terão que superar obstáculos jurídicos e logísticos que exigem recursos e orientação”.
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