O Brasil está disposto a entrar em um mercado bilionário dominado pela China e que é fundamental para a produção de aparelhos de alta tecnologia, como laptops, iPods e até mísseis. Técnicos do governo avaliam o potencial do país para explorar as chamadas terras raras, conjunto de 17 elementos químicos encontrados em jazidas minerais e que há até pouco tempo não passavam de siglas na tabela periódica.
A ideia é consolidar um programa de pesquisa e desenvolvimento para minerais estratégicos, entre eles terras raras, além de traçar uma radiografia dos consumidores nacionais e identificar potenciais produtores. Assim, o governo pretende retomar a atividade - que hoje não representa sequer 1% da produção mundial - num segmento em que o país já foi líder global.
Hoje, os chineses respondem por 97% da produção internacional, com 120 mil toneladas por ano. Paralelamente, as Indústrias Nucleares do Brasil (INB) estão negociando com a Universidade Federal Fluminense (UFF) a realização de pesquisas no oceano com o objetivo de identificar novos depósitos de terras raras no país.
A INB assumiu a exploração de terras raras no Brasil nos anos 90, após a extinção da Nuclemon, estatal que estava à frente da atividade até então. Umas das razões que fizeram a Nuclemon sair de cena foi a entrada com força da China nesse mercado, que jogou os preços para baixo, tornando a produção pouco lucrativa. Ironicamente, é a China que poderá levar o Brasil a ampliar sua atuação no segmento. Após restrições impostas por Pequim às exportações de terras raras, em setembro de 2010, o preço da tonelada saiu de US$ 5 mil para US$ 50 mil.
Tecnologia e meio ambiente: desafios
Com esse salto, os técnicos do governo avaliam que está na hora de o Brasil voltar a ter destaque nesse nicho. Em 2010, o mercado mundial de terras raras movimentou US$ 2 bilhões. Se os preços se mantiverem no patamar atual e a demanda continuar a crescer - estudo do Congresso americano aponta para uma demanda de 180 mil toneladas em 2012, ante as 134 mil em 2010 -, o mercado potencial para o próximo ano é de US$ 9 bilhões.
Com produção residual, de apenas 650 toneladas de terras raras em 2009, segundo últimos dados disponíveis, o Brasil estaria praticamente fora desse boom, apesar de ostentar o título de terceiro maior produtor mundial. O segundo colocado é a Índia (2.700 toneladas).
Relatório feito por um grupo de trabalho do Ministério de Minas e Energia (MME) e o Ministério de Ciência e Tecnologia (MCT), entregue às autoridades no fim de 2010, aponta que entre os desafios brasileiros está o desenvolvimento de novas tecnologias para aproveitamento desses elementos.
Há ainda a questão ambiental. Na produção de terras raras, produz-se também elementos radioativos, que exigem armazenamento especial.
- Os problemas associados à produção das terras raras a partir da monazita (um dos minerais em que esses elementos são encontrados no Brasil) são de natureza ambiental, notadamente o destino a ser dado aos rejeitos contendo urânio e tório - diz o diretor de Recursos Minerais da INB, Otto Bitencourt.
Para Ronaldo Luiz Santos, pesquisador do Centro de Tecnologia Mineral, órgão ligado ao MCT, que integrou o grupo de trabalho interministerial, o essencial é que a iniciativa privada abrace a ideia do governo de retomar a produção de terras raras.
- As terras raras são uma questão de soberania nacional, pela multiplicidade de seus usos, inclusive na área de defesa e na indústria petrolífera. Precisamos de uma política estratégica de fomento à sua produção e arrojo empresarial para promover o aproveitamento das jazidas.
Gadolínio, cério e túlio são alguns desses elementos ditos raros. Apesar dos nomes esquisitos, o brasileiro já se acostumou com eles mesmo sem saber. Eles estão nas telas das TVs em cores, nos celulares e até nos motores elétricos. Também são usados na indústria bélica, para a fabricação de sistemas de orientação de mísseis, por exemplo, e são importantes insumos da indústria de energia renovável, por serem empregados na produção de painéis solares e turbinas eólicas. São usados ainda no processo de refino do petróleo.
Apesar de batizados de raros, muitos são mais abundantes na natureza que outros metais, como cobre e ouro. Mas, por serem encontrados em pequenas concentrações, seu processo de produção é difícil e caro, o que os torna pouco viáveis economicamente. Daí sua raridade.
Depósitos em Goiás, Amazonas e Rio
No Brasil, sabe-se de depósitos de terras raras em Catalão (GO), Pitinga (AM) e São Francisco do Itabapoana (RJ). É neste último que as terras raras são encontradas na chamada monazita. De acordo com a INB, há estoques de 20 mil toneladas de monazita em suas dependências. A estatal chegou a elaborar um projeto para beneficiamento do mineral nos anos 90, mas acabou abandonando o projeto:
- O aumento da oferta, à época, de compostos de terras oriundos da China tornaram o projeto pouco atraente, e a operação foi suspensa. Agora, a INB está negociando com a UFF a realização de uma prospecção na plataforma continental (fundo do mar) adjacente aos depósitos terrestres buscando identificar novos depósitos para manutenção de suas atividades produtivas - diz Bitencourt.
Enquanto isso, outros países estão se mexendo para reduzir sua dependência da China. Em setembro passado, a Câmara de Representantes dos EUA aprovou projeto de lei para a criação de um programa de incentivo à exploração de terras raras, com recursos de US$ 70 milhões até 2015. A proposta ainda tem de ser apreciada pelo Senado. Já a Comissão Europeia quer estimular a reciclagem de terras raras por seus países-membros, além de assistir países africanos nessa atividade.
Exportação estratégica: 'O nióbio é nosso'
Se a China é uma rival para o Brasil no mercado de terras raras, pode se tornar aliada na exploração de outro mineral estratégico, o nióbio. O mineral ganhou notoriedade em 2010, quando documentos do governo americano vazados pelo Wikileaks incluíram as minas de Araxá (MG) e Catalão (GO) no mapa de áreas estratégicas para os EUA, o que vem levando internautas a organizar o movimento "o nióbio é nosso", a exemplo do que foi feito com o petróleo no passado.
Isso porque o Brasil é o maior produtor do mineral, com 96% da produção mundial, e daqui partem 80% do nióbio importado pelos EUA. Mas é no mercado asiático que estão as chances de expansão das exportações. Por suas propriedades - suporta baixas temperaturas e alta pressão -, o nióbio otimiza o uso do aço, sendo empregado na indústria de aviação, petrolífera e automobilística.
Em países desenvolvidos, são usados de 80 gramas a cem gramas de nióbio por tonelada de aço. Isso deixa o carro mais leve e econômico, por exemplo. Na China, são usadas apenas 25 gramas em média de nióbio por tonelada.
- Na China, está boa parte do potencial de expansão de nossas exportações - disse o diretor de assuntos minerários do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), Marcelo Ribeiro Tunes.
Em 2010, a receita com vendas externas de nióbio foi de US$ 1,5 bilhão. Foi o terceiro item da pauta de exportações minerais, atrás de minério de ferro e ouro. As duas empresas que atuam no setor no Brasil são a Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração, do grupo Moreira Sales e dona da mina de Araxá, e a Anglo American, proprietária da mina de Catalão.
A ideia é consolidar um programa de pesquisa e desenvolvimento para minerais estratégicos, entre eles terras raras, além de traçar uma radiografia dos consumidores nacionais e identificar potenciais produtores. Assim, o governo pretende retomar a atividade - que hoje não representa sequer 1% da produção mundial - num segmento em que o país já foi líder global.
Hoje, os chineses respondem por 97% da produção internacional, com 120 mil toneladas por ano. Paralelamente, as Indústrias Nucleares do Brasil (INB) estão negociando com a Universidade Federal Fluminense (UFF) a realização de pesquisas no oceano com o objetivo de identificar novos depósitos de terras raras no país.
A INB assumiu a exploração de terras raras no Brasil nos anos 90, após a extinção da Nuclemon, estatal que estava à frente da atividade até então. Umas das razões que fizeram a Nuclemon sair de cena foi a entrada com força da China nesse mercado, que jogou os preços para baixo, tornando a produção pouco lucrativa. Ironicamente, é a China que poderá levar o Brasil a ampliar sua atuação no segmento. Após restrições impostas por Pequim às exportações de terras raras, em setembro de 2010, o preço da tonelada saiu de US$ 5 mil para US$ 50 mil.
Tecnologia e meio ambiente: desafios
Com esse salto, os técnicos do governo avaliam que está na hora de o Brasil voltar a ter destaque nesse nicho. Em 2010, o mercado mundial de terras raras movimentou US$ 2 bilhões. Se os preços se mantiverem no patamar atual e a demanda continuar a crescer - estudo do Congresso americano aponta para uma demanda de 180 mil toneladas em 2012, ante as 134 mil em 2010 -, o mercado potencial para o próximo ano é de US$ 9 bilhões.
Com produção residual, de apenas 650 toneladas de terras raras em 2009, segundo últimos dados disponíveis, o Brasil estaria praticamente fora desse boom, apesar de ostentar o título de terceiro maior produtor mundial. O segundo colocado é a Índia (2.700 toneladas).
Relatório feito por um grupo de trabalho do Ministério de Minas e Energia (MME) e o Ministério de Ciência e Tecnologia (MCT), entregue às autoridades no fim de 2010, aponta que entre os desafios brasileiros está o desenvolvimento de novas tecnologias para aproveitamento desses elementos.
Há ainda a questão ambiental. Na produção de terras raras, produz-se também elementos radioativos, que exigem armazenamento especial.
- Os problemas associados à produção das terras raras a partir da monazita (um dos minerais em que esses elementos são encontrados no Brasil) são de natureza ambiental, notadamente o destino a ser dado aos rejeitos contendo urânio e tório - diz o diretor de Recursos Minerais da INB, Otto Bitencourt.
Para Ronaldo Luiz Santos, pesquisador do Centro de Tecnologia Mineral, órgão ligado ao MCT, que integrou o grupo de trabalho interministerial, o essencial é que a iniciativa privada abrace a ideia do governo de retomar a produção de terras raras.
- As terras raras são uma questão de soberania nacional, pela multiplicidade de seus usos, inclusive na área de defesa e na indústria petrolífera. Precisamos de uma política estratégica de fomento à sua produção e arrojo empresarial para promover o aproveitamento das jazidas.
Gadolínio, cério e túlio são alguns desses elementos ditos raros. Apesar dos nomes esquisitos, o brasileiro já se acostumou com eles mesmo sem saber. Eles estão nas telas das TVs em cores, nos celulares e até nos motores elétricos. Também são usados na indústria bélica, para a fabricação de sistemas de orientação de mísseis, por exemplo, e são importantes insumos da indústria de energia renovável, por serem empregados na produção de painéis solares e turbinas eólicas. São usados ainda no processo de refino do petróleo.
Apesar de batizados de raros, muitos são mais abundantes na natureza que outros metais, como cobre e ouro. Mas, por serem encontrados em pequenas concentrações, seu processo de produção é difícil e caro, o que os torna pouco viáveis economicamente. Daí sua raridade.
Depósitos em Goiás, Amazonas e Rio
No Brasil, sabe-se de depósitos de terras raras em Catalão (GO), Pitinga (AM) e São Francisco do Itabapoana (RJ). É neste último que as terras raras são encontradas na chamada monazita. De acordo com a INB, há estoques de 20 mil toneladas de monazita em suas dependências. A estatal chegou a elaborar um projeto para beneficiamento do mineral nos anos 90, mas acabou abandonando o projeto:
- O aumento da oferta, à época, de compostos de terras oriundos da China tornaram o projeto pouco atraente, e a operação foi suspensa. Agora, a INB está negociando com a UFF a realização de uma prospecção na plataforma continental (fundo do mar) adjacente aos depósitos terrestres buscando identificar novos depósitos para manutenção de suas atividades produtivas - diz Bitencourt.
Enquanto isso, outros países estão se mexendo para reduzir sua dependência da China. Em setembro passado, a Câmara de Representantes dos EUA aprovou projeto de lei para a criação de um programa de incentivo à exploração de terras raras, com recursos de US$ 70 milhões até 2015. A proposta ainda tem de ser apreciada pelo Senado. Já a Comissão Europeia quer estimular a reciclagem de terras raras por seus países-membros, além de assistir países africanos nessa atividade.
Exportação estratégica: 'O nióbio é nosso'
Se a China é uma rival para o Brasil no mercado de terras raras, pode se tornar aliada na exploração de outro mineral estratégico, o nióbio. O mineral ganhou notoriedade em 2010, quando documentos do governo americano vazados pelo Wikileaks incluíram as minas de Araxá (MG) e Catalão (GO) no mapa de áreas estratégicas para os EUA, o que vem levando internautas a organizar o movimento "o nióbio é nosso", a exemplo do que foi feito com o petróleo no passado.
Isso porque o Brasil é o maior produtor do mineral, com 96% da produção mundial, e daqui partem 80% do nióbio importado pelos EUA. Mas é no mercado asiático que estão as chances de expansão das exportações. Por suas propriedades - suporta baixas temperaturas e alta pressão -, o nióbio otimiza o uso do aço, sendo empregado na indústria de aviação, petrolífera e automobilística.
Em países desenvolvidos, são usados de 80 gramas a cem gramas de nióbio por tonelada de aço. Isso deixa o carro mais leve e econômico, por exemplo. Na China, são usadas apenas 25 gramas em média de nióbio por tonelada.
- Na China, está boa parte do potencial de expansão de nossas exportações - disse o diretor de assuntos minerários do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), Marcelo Ribeiro Tunes.
Em 2010, a receita com vendas externas de nióbio foi de US$ 1,5 bilhão. Foi o terceiro item da pauta de exportações minerais, atrás de minério de ferro e ouro. As duas empresas que atuam no setor no Brasil são a Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração, do grupo Moreira Sales e dona da mina de Araxá, e a Anglo American, proprietária da mina de Catalão.
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