Por Roberto Lopes
Especial para o Poder Naval
“O que me parece é que os concorrentes não estão entendendo que a primeira opção da MB é o projeto do CPN. As propostas de navios de projeto do próprio estaleiro são a segunda opção e precisam ser muito boas para que a MB abandone o projeto do CPN”.
Foi com essas palavras que um oficial do setor do Material da Marinha do Brasil (MB) resumiu para o Poder Naval, no último fim de semana, o clima tenso – de “estica-e-puxa” – que existe, hoje, nos bastidores do Programa Classe Tamandaré (ex-Programa da Corveta Classe Tamandaré).
Entre os estaleiros europeus, ao menos três – Naval Group (França), TKMS (Alemanha) e Navantia (Espanha) – sondaram a MB sobre a possibilidade de ela vir a aceitar projetos de navios já fabricados que desfrutam de boa reputação, mas que diferem, consideravelmente, do projeto da Classe Tamandaré definido pelo Centro de Projetos de Navios da Marinha (CPN) – e precisam, por conta disso, ser adaptados à concepção do CPN para a embarcação.
Sediado no Rio de Janeiro, o Centro de Projetos está subordinado à Diretoria de Gestão de Programas Estratégicos da Marinha (DGePEM).
A concorrência da Classe Tamandaré como um todo está lançada à confusão por causa de algumas indecisões e mudanças de responsabilidade da MB na organização do certame, e também das interpretações errôneas de alguns dos estaleiros interessados na fabricação dos quatro navios Tamandaré.
A disputa visava, a princípio, a construção de “corvetas”, mas essa classificação foi eliminada (1) diante da tonelagem definida para a embarcação pelo CPN – 2.790 toneladas (mais apropriada à de uma fragata leve) –, e (2) da possibilidade de a Marinha aceitar projetos estrangeiros, acima das 3.000 toneladas.
Gowind – O representante, no Rio, de uma indústria naval europeia, confidenciou ao Poder Naval, que a empresa que tenta fazer a Marinha aceitar um projeto estrangeiro já pronto é o Naval Group (antiga DCNS) – “parceira estratégica” no Programa de Desenvolvimento de Submarinos (PROSUB).
De acordo com essa fonte, os franceses estão tentando vender uma versão da conhecida classe Gowind 2500, recentemente exportada para a Marinha do Egito.
Na primeira quinzena de novembro passado, durante uma conferência de imprensa em Dubai, o presidente francês, Emmanuel Macron, anunciou que os Emirados Árabes Unidos encomendaram duas corvetas Gowind.
Os navios serão construídos pelo Naval Group em cooperação com o Abu Dhabi Shipbuilding (ADSB), uma indústria naval local.
A compra das Gowind inclui uma opção para mais dois navios.
De acordo com o portal de notícias Navy Recognition, elas não devem ser equipadas com o sistema de gerenciamento de combate SETIS, do Naval Group, e sim com o Thales Tacticos – que a Marinha das Filipinas acaba de rejeitar para as suas duas fragatas leves polivalentes, de 2.600 toneladas, em construção na Coreia do Sul. O gerenciador de combate desses navios será um equipamento tipo ICMS (sigla de Integrated Combat Management System) desenvolvido pela companhia sul-coreana Hanhwa.
Ficha resumida da versão da Gowind 2500 contratada pelos Emirados Árabes Unidos:
- Deslocamento: 2.600 toneladas (inferior ao do projeto classe Tamandaré do CPN);
• Velocidade máxima: 25 nós (igual à do projeto do CPN);
• Tripulação: 80 pessoas, incluindo o destacamento do helicóptero (maior que a especificada no projeto do CPN); e
• Alcance: 3.700 milhas náuticas a 15 nós
Segundo uma fonte do Poder Naval, o projeto da Gowind 2500 precisará incorporar muitas melhorias para fazer frente ao da classe Tamandaré definido pelo CPN.
Derivações – O grupo alemão ThyssenKrupp Marine System (TKMS) ainda não entregou ao setor de Material da MB a sua proposta relativa à classe Tamandaré.
Em abril do ano passado, os alemães aproveitaram a mostra de armamentos LAAD, que aconteceu no pavilhão de exposições do Riocentro, para apresentar aos chefes navais brasileiros uma fragata de 3.100 toneladas, pertencente à conhecida classe MEKO oferecida ao mercado em vários deslocamentos.
Essa nova unidade, seria semelhante ao navio que os alemães estão propondo para o programa de Plataformas Estratégicas de Superfície (PES) da Armada da Colômbia.
Representantes da indústria naval alemã ficaram irritados com um texto publicado neste blog que atribuiu a oficiais da Marinha envolvidos na concorrência do Programa Tamandaré a opinião de que o projeto das MEKO 100 é inferior ao projeto concebido pelo CPN.
Segundo eles, o diretor-geral do Material da Marinha, almirante de esquadra Luiz Henrique Caroli, conheceu a MEKO quando comandou a Força-Tarefa Marítima da UNIFIL, no Líbano, e gostou muito do desempenho da embarcação.
MEKO 600 – A inclinação da TKMS por oferecer à MB “derivações” dos seus navios é antiga, e bem conhecida.
No fim dos anos de 2000, quando a Marinha lançou o Programa de Obtenção de Meios de Superfície (PROSUPER), estipulando entre os navios almejados “fragatas de 6.000 toneladas”, a ThyssenKrupp logo tentou interessar a Força Naval brasileira em uma versão dos navios Classe 124 (“Sachsen”), de 5.800 toneladas – no Brasil apresentados como MEKO 600.
“Eles (TKMS) consideram que, por dar nomes diferentes, como foi o caso da Meko 600 e agora das Tamandaré, será um produto novo”, diz uma fonte. “Na verdade, entendo que não. Para mim, é só uma derivação”.
Uma terceira empresa europeia que acena para a MB com uma embarcação que representa um “puxadinho” (derivação) da fragata leve classe Tamandaré, concebida pelo CPN, é a espanhola Navantia.
Nesse caso, o navio tomado como parâmetro é o do tipo AVANTE 3000, também conhecido como classe 2400, de 2.419 toneladas, que parte do mercado internacional trata como corveta mas, em termos técnicos, dada a sua configuração, pode ser qualificado como um navio-patrulha oceânico – classificação recebida, por exemplo, na Armada da Venezuela, onde é chamado de Patrullero Oceánico de Vigilancia.
O 2400 espanhol seria oferecido ao Brasil em uma versão mais pesada e bem artilhada que seu modelo original.
Datas – Um “cronograma tentativa” da Marinha prevê que a fragata Tamandaré comece a ser construída – dentro ou fora do país – no prazo de 13 meses, isto é, em abril de 2019, e fique pronta em março de 2024.
O segundo navio da classe, já batizado de Jerônimo de Albuquerque, deve ter sua construção iniciada – obrigatoriamente no Brasil – em abril de 2020, e encerrada em setembro de 2024.
O terceiro, Cunha Moreira, começaria a ser fabricado em janeiro de 2021, e ficaria pronto em junho de 2025.
A quarta e última plataforma desse primeiro lote seria o Mariz e Barros, com início de produção previsto para julho de 2021, e entrega à Esquadra até o fim de dezembro de 2025.
Caso essas previsões possam ser cumpridas (o que não será fácil), fica claro que o ápice da produção dessa nova série de embarcações acontecerá no período de julho de 2021 a julho de 2024, quando todas as quatro estarão em diferentes estágios de fabricação.
Os chefes navais brasileiros não descartam a possibilidade da classe Tamandaré ser ampliada por meio da fabricação de mais quatro navios.