Executivo com maior tempo na presidência da Petrobras, José Sergio Gabrielli admitiu ontem pela primeira vez que pode voltar à política. Ele, que disputou a primeira eleição em 82 e a última em 90, sem nunca ter vencido, descartou "peremptoriamente" a possibilidade de uma candidatura à Prefeitura de Salvador em 2012. "Não nego que posso vir a ser candidato, mas é muito cedo para tomar decisão", respondeu, quando questionado se pretende concorrer ao governo da Bahia em 2014. Gabrielli já ultrapassou os seis anos e quatro meses de mandato de Joel Rennó, que até ontem tinha ocupado o poderoso cargo por mais tempo.Essa afirmação foi a única sobre política que Gabrielli fez na entrevista concedida ontem ao Valor para falar sobre o novo plano estratégico da companhia, de US$ 224,7 bilhões, o "maior plano de negócios do mundo", como o executivo faz questão de destacar. "Esse plano é mais do que o governo americano teve de orçamento em dez anos para levar o homem à lua, mais do que os aliados investiram durante a Segunda Guerra Mundial", afirma o executivo.
Com 688 projetos acima de US$ 25 milhões com maturidades diferentes, o plano mantém o horizonte mais longo até 2020. Muitos dos projetos serão cimentados apenas no fim da década, incluindo o início da produção em grande escala no pré-sal, quando a companhia planeja pular dos atuais 2,1 milhões de barris de petróleo/dia para quase 5 milhões de barris/dia em 2020, dos quais 2 milhões de barris no pré-sal. Esse processo vai exigir um extraordinário esforço de construção de sondas, plataformas de produção de diversos tipos e barcos de apoio. É também para 2020 que Gabrielli aponta ao defender as novas refinarias.
"Sem as [novas] refinarias a importação [do país] seria de 40% do mercado. E a Petrobras não é suicida. Não vamos perder 40% do nosso mercado", enfatizou.
Gabrielli mostra números que justificam o plano que, segundo ele, não teve nenhum atraso, apesar de ter sido apresentado três vezes ao conselho de administração. "É pura intriga. Não tem o vai e vem. Estamos falando no maior plano de negócios do mundo. Ninguém vai aprovar sem olhar com cuidado o que está fazendo. O processo de aprofundamento naturalmente tem uma aproximação entre diretoria e conselho de administração, que estão sempre interagindo. Estamos com um plano grande depois de crescer muito."
O executivo começou a responder sobre os efeitos, na Petrobras, da política industrial que o governo promete divulgar em breve lembrando o tamanho da frota de embarcações que a estatal vai ter em 2020. Cita, por exemplo, as encomendas de 65 sondas de perfuração em águas profundas, acima de 2 mil metros de lâmina d"água, quando atualmente a frota mundial é de 70 sondas do tipo. E diz que quem tem uma escala desse tamanho pode, e deve, abrir e expandir a indústria nacional. No total, a empresa vai adicionar 658 embarcações de portes e complexidade diversos à frota até 2015 e, em 2020, esse número terá aumentado para 810 embarcações.
O executivo ressalta ainda o "potencial gigantesco" de produção no pré-sal e as vantagens trazidas pelo salto na produção para a companhia desenvolver um parque de fornecedores nacionais. E frisa que é errado avaliar a questão considerando o fato de a companhia ser estatal, e com menos governança, segundo os críticos.
"A diferença não é por ser estatal nem [por ser] privada. É o tamanho, a escala", enfatiza. Gabrielli lembra em seguida os preços da última licitação para afretamento de sondas que ficaram pouco acima do mercado internacional e cita o exemplo da plataforma P-57, que, segundo ele, saiu em prazo menor do que seria se fosse feita no exterior a um preço igual. Com a escala das encomendas da empresa, a expectativa é pagar preços mais altos no início e preços decrescentes ao final das encomendas. "Nós temos uma situação diferenciada", enfatiza.
O mesmo argumento é usado para justificar o fato de a empresa ter perdido R$ 55 bilhões em seu valor de mercado no primeiro semestre deste ano. Primeiro ele lembra que a Petrobras fez uma capitalização "que foi a maior da história do mundo" e isso demanda tempo para o mercado "deglutir e para ajustar o portfólio dos acionistas". Segundo, discorre sobre as expectativas de preço e sobre a economia mundial.
Ele lembra que atualmente o preço de petróleo alcançou faixas parecidas com as de 2008, quando a cotação atingiu o pico de US$ 147, com a diferença de a economia mundial estar hoje "rateando". Tudo isso conjugado com uma nova realidade, a seu ver não muito bem entendida, que é o fato de o crescimento mundial depender cada vez mais do crescimento de países antes periféricos, como China, Índia, Brasil, África, e menos da Europa, Estados Unidos e Japão.
"Esse fenômeno altera as relações econômicas e políticas, mas econômicas em primeiro lugar, e isso se reflete nos mercados. A Petrobras, por outro lado, tem uma perspectiva de crescimento que, quem sabe fazer conta, vai ver que ela vai precisar de muito investimento. E é a longo prazo. Consequentemente, não é uma empresa que vai dar grande retorno e folga de caixa no curto prazo. Ela não pode ter o crescimento que ela está prevendo... ela não vai dar resultado no curto prazo, só dá resultado no longo prazo", avisa.
Os investimentos de US$ 53,4 bilhões destinados ao desenvolvimento da produção no pré-sal - equivalentes a 45,4% dos US$ 117,7 bilhões destinados à exploração e produção até 2015 - foram alvo de críticas de alguns analistas e elogiados por outros. Gabrielli gostou particularmente do relatório do BTG Pactual em que o analista Gustavo Gattass elogia o aumento dos investimentos no pré-sal em detrimento do pós-sal. "Dois anos atrás, teríamos dito que esse é um movimento um pouco arriscado", diz o relatório, que tem recomendação de compra para as ações.