Caros Leitores, boa tarde. Existe uma máxima, “cachorro que late não morde”. Não adianta gritar, espernear, ficar abismado, ficar perplexo e a Presidente Dilma Rousseff “cobrar geral” do Presidente americano Barack Obama sobre o caso da espionagem americana no mundo, e também no seu calo, pois na verdade, o “cobrar geral” esconde por trás da política externa e também da própria política de defesa brasileira, os erros, ou falta de um plano maior e estratégico sobre o Brasil, pelo menos no quesito defesa, que de alguma forma como é relegada, termina em um estado de segurança sofrível no país.
O governo brasileiro, e nossos políticos, tanto senado como deputados, quando se mostram perplexos com as denúncias de espionagem por parte dos americanos no mundo, na verdade demonstram que estão literalmente “cegos” e sem “inteligência” para tratar de um tema muito sensível para o país.
É a coisa mais piegas ver um Chefe de Estado, como nossa presidente Dilma, que pede “regras para a espionagem”, por favor me explique, como assim regras para a espionagem? Os Estados Unidos durante anos, cobram posturas contra a espionagem chinesa, russa e até mesmo alemã, e nem por isso afetam suas relações. Na história universal, a espionagem sempre foi uma das grandes “armas” para o desenvolvimento dos Estados. Tratar o tema, como o Brasil está tratando, na verdade é relegar a história universal para segundo plano, e deixar ao mundo uma imagem de um país totalmente enfraquecido do ponto de vista da Defesa Nacional e Internacional, por conseguinte, as conseqüências são claras e notórias, sofremos de um estado de insegurança pública, aumento vertiginoso do narcotráfico em todo território nacional, ações de bio-espionagem na Amazônia, perda de competitividade nas negociações internacionais, avanço do contrabando de armas em nossas fronteiras (considerando inclusive o desarmamento do cidadão de bem), e a última conseqüência, o descaso com a política nacional de inteligência (PNI) e a falta de investimentos em guerra cibernética e contra-espionagem brasileira.
Dar muito crédito para Edward Snowden e seu pupilo jornalista, Gleen Greenwald, na verdade é demonstrar que não entende nada da Atividade de Inteligência. Como diria o alto escalão da Agência de Segurança Nacional dos Estados Unidos (NSA), “quebrar códigos é nosso trabalho”, é muito claro na política americana, que os procedimentos de inteligência, além de terem apoio incondicional do Congresso Americano, os mesmos fazem parte de suas estratégias enquanto desenvolvimento da potência comercial e militar. Questionar isso, na verdade, demonstra mais uma falta de processo enquanto estadista, e também de posicionamento estratégico do Brasil perante o mundo. Particularmente acredito no que o Embaixador Americano, Thomas Shannon, afirmou sobre a espionagem americana, “o Brasil não é o nosso alvo”, mas o país tem todas as condicionantes que a inteligência americana necessita para produzir informações sensíveis sobre diversos temas mundiais, e até mesmo da América Latina. Considerando o poder regional do Brasil, sua riqueza energética, a fraqueza dos procedimentos de segurança, os problemas políticos em suas fronteiras, as percepções que as diversas células terroristas espalhadas no mundo têm sobre o país (“hotel” para planejamento de atos terroristas pelo mundo), corrupção dos políticos, corrupção nas instituições públicas e a falta de um projeto de poder nacional, o Brasil se torna o próprio ambiente para o desenvolvimento da espionagem americana, inclusive considerando um outro dado importante, o país é um dos principais “hub’s” de internet e comunicações no mundo.
Mas o mais descabido, e irreal neste caso todo, é ver que o tema já era tratado a muito tempo, tanto nas esferas da Agência Brasileira de Inteligência (ABIN), como também nas esferas da Inteligência Militar do Exército Brasileiro, inclusive em um trabalho publicado na Revista A Lucerna, da Escola de Inteligência Militar do Exército Brasileiro, em 2012, com diversos artigos sobre Guerra Cibernética e estudos de inteligência, o próprio sistema de inteligência americana e seus desdobramentos estão explícitos, considerando inclusive que com base nos diversos estudos, teoricamente, o governo brasileiro já devia saber destes procedimentos. Por sinal, desde 1999, agentes americanos têm autorização do governo brasileiro para atuar sob “cobertura diplomática” contra ações do terrorismo internacional e do narcotráfico, e não são somente agentes da CIA, mas sim da NSA, do FBI e da DEA (agência americana de combate ao narcotráfico). Por sinal, tanto Polícia Federal, como também a ABIN, recebem colaborações de inteligência por parte dos diversos órgãos de espionagem dos Estados Unidos.
Mas com isso, o problema é maior, pois os princípios da espionagem e inteligência de Estado, na verdade é suprir o Chefe de Estado com informações sensíveis, com menor risco possível e que possam contribuir no processo decisório do país. Inclusive em 2009, o professor Marco Cepik, produziu uma nota técnica sobre o Sistema Brasileiro de Inteligência com revisões e sugestões profundas para um melhor aparato do sistema, e potencializar o mesmo em defesa nacional, contra-espionagem, novo posicionamento internacional do Brasil e guerra cibernética. O estudo foi encomendado pelo Centro de Gestão e Estudos Estratégicos do Ministério da Ciência e Tecnologia. Para maior informação acesse: http://geopr1.planalto.gov.br/saei/images/publicacoes/2009/nota_tecnica_sistema_brasileiro_de_inteligencia.pdf
O professor Marco Cepik em 2003 publicou, pela Editora FGV, um tratado sobre a questão política e democrática da espionagem e da inteligência, seu livro, “Espionagem e Democracia”, foi um dos principais estudos sobre o tema, e uma profunda reflexão do uso e das atividades de inteligência no Estado. Com o estudo, ficou mais do que comprovado o uso contínuo das atividades de inteligência pelas grandes nações, como também a necessidade do Estado brasileiro em aprofundar as técnicas, considerando os cenários prováveis do avanço da mesma no mundo. Mas como tudo o que é produzido no Brasil de forma intelectual, os estudos ficam nas gavetas, e por exemplo, desde novembro de 2010 a Política Nacional de Inteligência está parada no Palácio do Planalto. Por quê será? Medo do que?
Outro ponto importante, em 2009 o professor e estrategista, Darc Costa, que inclusive foi Vice Presidente do BNDES no período de 2003 a 2004, escreveu um tratado, muito discutido em Brasília e na Escola Superior de Guerra no Rio de Janeiro, a obra “Fundamentos para o Estudo da Estratégia Nacional”, publicado pela Editora Paz e Terra. O mesmo é categórico em afirmar, considerando os diversos anos de estudos e construção de cenários para o Brasil, “os gastos com a defesa devem ser diretamente relacionados com o valor das riquezas a serem preservadas”, algo impensável hoje no Brasil, mas o mais interessante que o professor Darc Costa categoriza é: “a criação de grupos voltados para a guerra eletrônica e para o estudo de formas de ataques e defesa no campo da informática deve merecer a maior das prioridades na alocação de recursos de ciência e tecnologia para aplicações militares”. Nesse ponto complemento, para aplicações na contra-espionagem de Estado, e na própria política de defesa nacional.
E para concluir o descaso com a Defesa e a Espionagem, é mais do que reconhecido pelo Governo Brasileiro, que a falta de investimentos na política de defesa cibernética demonstra o quanto o sistema brasileiro está vulnerável. O próprio comandante do Centro de Defesa Cibernética do Exército, General José Carlos dos Santos, reconhece que “a falta de investimento deixa sistema sob risco constante” (Revista Veja, 11/09/2013).
O Governo Brasileiro não pode tratar o tema como tratou, ir para imprensa e se posicionar “abismado” com o ocorrido, pois parece que estão utilizando os acontecimentos com outras finalidades. Será um trabalho de desinformação contra a sociedade brasileira?
Se a Presidente Dilma quisesse saber o que está acontecendo, antes das novas notícias de Snowden no Programa Fantástico da TV GLOBO, ela deveria ter lido as obras, “Intelligence and Strategy – Selected Essays” de John Robert Ferris, e também um clássico da espionagem americana, “The Craft of Intelligence” de Allen W. Dulles.
Mas antes de gritar com Barack Obama, vamos ver o quanto estamos desguarnecidos com o tema inteligência e espionagem, e atuar para resolver, pois nossas fronteiras e o estado permanente de violência pública, só demonstram, que o Brasil está “burro” e precisa urgente de uma política clara de inteligência. Outro ponto, ouça mais os acadêmicos que já debruçam sobre o tema, e reveja sua estrutura de inteligência a partir do Gabinete de Segurança Institucional.
EXAME ..SNB